“A carreira acadêmica não é amigável com as mulheres”

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Resultados de pesquisadoras durante a pandemia mostram que a área acadêmica é desigual, especialmente para as mães

Por Ana Carolina Coelho

 

“Você é uma guerreira!” Essa frase costuma ser dita em tom elogioso para as mães, consideradas super-heroínas contemporâneas.

A imagem da guerreira é profundamente enraizada quando o assunto é maternidade, em especial se a mulher também investe em sua carreira. Ela passa a ser vista como uma pessoa forte, que supera obstáculos. Mães acadêmicas sofrem uma pressão imensa para se manter produtivas.

Também é comum ouvir que ser mãe foi uma escolha. Ou que a mulher vai conseguir avançar e superar; afinal, ela é uma lutadora. Em outros termos, se ela escolheu a maternidade e insistiu em continuar no espaço público científico-acadêmico, já sabe que viverá uma guerra cheia de armadilhas. Vamos conversar sobre essas armadilhas.

Existe uma verdadeira disputa desigual nas batalhas da qualificação acadêmica. A expressiva queda na produção das mulheres nos anos iniciais da maternidade tem impacto direto em nossos currículos e, consequentemente, em nossas carreiras.

Conforme mostram os diversos coletivos e grupos pelo Brasil todo – com pesquisas, relatos, debates e cada vez mais dados quantitativos e qualitativos sobre os impactos da maternidade na capacitação e permanência das mães no ambiente acadêmico –, as mulheres até conseguem mais bolsas de pesquisa na graduação, mas avançam menos nos números de bolsas de pós-graduação e demais fomentos de apoio à pesquisa, expressivamente mais concedidos aos homens, a despeito de serem ou não pais.

Enquanto toda a carga de cuidados recair sobre os braços das mães e todas as formas de rede de apoio forem oriundas de recursos majoritariamente particulares, estaremos na mesma arena, mas com armas desiguais, ou seja, fadadas a morrermos entrincheiradas e exaustas.

A luta das mulheres mães no ambiente acadêmico é uma história de existências, resistências e desistências. E as soluções devem ser uma resposta coletiva, institucional e empática nos primeiros anos de vida da criança com suas famílias.

É preciso que sejam criados editais específicos para mães; creches em tempo integral e noturnas; flexibilidade nas atribuições, na carga de trabalho e nos prazos em esferas administrativas; apoio financeiro para participação em eventos com previsão de inclusão da criança; espaços para amamentação; contagem do tempo de licença nos currículos Lattes e na pontuação proporcional na concorrência de bolsas e cargos; instalação de fraldário em TODOS os banheiros e espaços recreativos nos eventos acadêmico-científicos. Esses são apenas alguns dos inúmeros exemplos de políticas que podem ser implementadas pelas universidades e órgãos de fomento para que a luta comece a ganhar alguma equidade.

Guerreiras precisam de armas e recursos, ou seja, de condições materiais concretas. Aliás, dizer que somos guerreiras é também uma armadilha. Sob o manto da super-heroína se escondem falsas escolhas – feitas por quem, às vezes, desistiu, dada a absoluta sobrecarga física, emocional e psicológica – e muito sangue das que conseguiram prosseguir – o custo é o adoecimento e, sobretudo, muita culpa.

Em vez de cansadas, poderíamos estar investindo todas as energias em nossas carreiras, pesquisas e em maternidades leves, felizes e plenas. E, se já nos sobressaímos apesar das armadilhas, imaginem o que poderemos alcançar com os recursos e suportes adequados.

Dias mulheres virão!


Foto/Acervo pessoal
Ana Carolina Coelho é mãe, feminista, escritora, poeta, plantadora de árvores, doutora em história política, professora associada da Universidade Federal de Goiás, coordenadora do Grupo de Trabalho de Gênero

Fonte:https://claudia.abril.com.br/carreira/academia-desigual-mulheres-maes/

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